Busca sem resultado
jusbrasil.com.br
18 de Maio de 2024

A responsabilidade subsidiária dos avós de prestar alimentos avoengos aos netos

Publicado por Amanda Pfeifer
há 3 anos

Os alimentos têm sua função e importância para garantir a manutenção da dignidade humana, garantindo a integridade física e o direito a inviolabilidade do direito à vida.

O ser humano para sobreviver precisa viver em sociedade e é por meio da divisão de encargos que ele consegue obter os recursos necessários a manter-se vivo, é necessário distribuir o ônus da sobrevivência a toda sociedade, não somente a família1 nuclear.

A pensão avoenga tem sua ancestralidade na evolução da sociedade, especificamente, em seus valores, culturas e até mesmo religiões. É gradual o número de casais separados e filhos nascidos fora do casamento, ocasionando na falta de estrutura familiar. Nestes casos, o Estado deve procurar mecanismos para garantir os direitos fundamentais da vida e da dignidade da pessoa humana, por meio de uma política que alcance a proteção da sobrevivência digna do incapaz de prover a sua própria subsistência.

A obrigação alimentar dos avós para prestar alimentos aos netos encontra respaldo no artigo 1.698 do Código Civil: “se o parente que deve alimentos em primeiro lugar não estiver em condições de suportar totalmente o encargo, serão chamados a concorrer os de grau imediato2. Diante disto, têm-se a obrigação e a responsabilidade subsidiária dos avós, em sucessão à dos pais.

No entanto, para que estes alimentos sejam fixados será necessário que os pais não tenham, comprovadamente, condições de o fazê-lo. Nesta toada, somente após o esgotamento dos meios processuais cabíveis, utilizando-se a cobrança e a coerção do genitor para o pagamento, é que passaria a ser viável o redirecionamento da cobrança aos avós.

A mera irregularidade do genitor não teria o condão de permitir a fixação dos alimentos avoengos. Este é o entendimento jurisprudencial do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:

“ALIMENTOS. OBRIGAÇÃO AVOENGA. FIXAÇÃO DE ALIMENTOS PROVISÓRIOS. TUTELA PROVISÓRIA. DESCABIMENTO. A obrigação de prover o sustento dos filhos é de ambos os genitores, isto é, do pai e da mãe, e de um na falta do outro. O chamamento dos avós para prestar alimentos somente cabe em situação de excepcional necessidade. O fato de o pai não estar prestando de forma regular os alimentos não transfere automaticamente a responsabilidade para os avós paternos. Descabe fixar alimentos provisórios quando os avós são idosos, têm ganhos modestos e boa parte está comprometida com gastos com os seus problemas de saúde. Recurso Provido”i3.

Não obstante, se o genitor for devedor contumaz, a fixação alimentar dos avós, em meu ver, deveria ser decretada desde logo. Isto porque, trata-se, via de regra, de direito fundamental referente às necessidades básicas de incapazes.

De toda sorte, faz-se necessária a observação do Enunciado 342 das Jornadas de Direito Civil que traz o seguinte texto:

“Observadas suas condições pessoais e sociais, os avós somente serão obrigados a prestar alimentos aos netos em caráter exclusivo, sucessivo, complementar e não-solidário quando os pais destes estiverem impossibilitados de fazê-lo, caso em que as necessidades básicas dos alimentandos serão aferidas, prioritariamente, segundo o nível econômico-financeiro de seus genitores”4.

Posto isto, deve-se atentar sempre as condições socioeconômicas dos avós. Pois não é crível defender o direito do filho incapaz e colocar em vulnerabilidade os ascendentes em segundo grau, porquanto, geralmente, são idosos suscetíveis a doenças e dispêndios médicos/financeiros, podendo a obrigação alimentar dificultar gravemente sua subsistência digna.

A capacidade econômica do alimentante se refere ao seu patrimônio deduzindo-se os débitos contumazes. O devedor avoengo deve possuir capacidade econômica para satisfazer a pensão alimentícia sem que isto prejudique o seu próprio sustento, não existiria fundamento no fato de que uma pessoa para suprir as necessidades de outra prejudicasse a sua própria dignidade.

Para Maria Helena Diniz seria injusto obrigar o possível alimentante a sacrificar-se e a passar privações para cumprir com sua obrigação de alimentar, caso o obrigado a prestar alimentos tiver apenas o indispensável à própria mantença, tanto mais que possa existir pessoa na linha dos obrigados que tenha condições de cumprir a obrigação alimentar sem sacrifícios. As circunstâncias do caso concreto devem ser observadas, não se admite que o alimentante declare a sua impossibilidade econômica de prover os alimentos porque seu patrimônio encontra-se totalmente comprometido com débitos relacionados tão somente a dívidas luxuosas, a proteção da vida e da subsistência do alimentando tem maior força que necessidades meramente supérfluas com intuito de acréscimo patrimonial e enriquecimento5.

Por fim, a subsidiariedade dos avós nos alimentos avoengos possui o seu lado positiva quando presta uma segurança jurídica aos ascendentes de que não serão impelidos a adimplir, injustamente, os alimentos não pagos pela inércia e/ou comodismo dos genitores. Os genitores é que são os primeiros responsáveis. O lado negativo abarca o momento em que o alimentando, possuindo necessidade da manutenção da sua sobrevivência, encontra-se em situação alarmante e precisa esgotar os meios jurídicos de coerção com os genitores para, posteriormente, cobrar os avós. Para isso, o magistrado, norteado pelo princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, elencado no artigo 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente6, deverá priorizar a defesa dos interesses dos incapazes, não os deixando a mercê da boa vontade do seu núcleo familiar.

1 GARDIOLO, Ricardo C. Revista de Ciências Jurídicas: Alimentos devidos pelos avós. Paraná: Universidade Estadual de Maringá, 2004, v. 2, n.1, p. 241.

2 BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil.

3 Agravo de Instrumento nº 70082947367, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, Julgado em 19/12/2019.

4 Enunciado nº 342, IV Jornada de Direito Civil.

5 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: teoria geral das obrigações. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 2008, v. 2, p. 29.

6 BRASIL. Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990.

  • Publicações10
  • Seguidores8
Detalhes da publicação
  • Tipo do documentoArtigo
  • Visualizações788
De onde vêm as informações do Jusbrasil?
Este conteúdo foi produzido e/ou disponibilizado por pessoas da Comunidade, que são responsáveis pelas respectivas opiniões. O Jusbrasil realiza a moderação do conteúdo de nossa Comunidade. Mesmo assim, caso entenda que o conteúdo deste artigo viole as Regras de Publicação, clique na opção "reportar" que o nosso time irá avaliar o relato e tomar as medidas cabíveis, se necessário. Conheça nossos Termos de uso e Regras de Publicação.
Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/artigos/a-responsabilidade-subsidiaria-dos-avos-de-prestar-alimentos-avoengos-aos-netos/1237646895

Informações relacionadas

Julio Martins, Advogado
Artigoshá 3 anos

É válida a Promessa de Cessão de Direitos Hereditários por Instrumento Particular?

Aline Vieira de Eça, Advogado
Modeloshá 7 anos

[Modelo] Acordo de Pensão Alimentícia

5 Comentários

Faça um comentário construtivo para esse documento.

Não use muitas letras maiúsculas, isso denota "GRITAR" ;)

Apenas um comentário Dra. Amanda sem o objetivo de desmerecer o seu ótimo texto.

Esta é daquelas Leis Injustas que nós os leigos, que não entendemos nada de Direito mas entendemos um pouco de lógica.

No caso de Alimentos Avoengos quem não deu causa pode ser obrigado pagar.

Isto não ocorre na área criminal pois um criminoso não transfere penas para ninguém.

Isto não ocorre na área cível pois um devedor não transfere dívidas para seus herdeiros.

Assim como criminosos hediondos tem um fundo para custear suas penas deveríamos ter um fundo para custear os inadimplentes de alimentos.

Punir quem não deu causa é uma grande injustiça.

Apenas uma opinião. continuar lendo

Pois é, exatamente o que penso, a pessoa não teve NENHUMA ação, mas é chamada para pagar a conta. continuar lendo

Esse é o tipo de coisa bizarra, a pessoa não teve NENHUMA responsabilidade, mas é chamada a pagar a conta.

Claro que a intenção é boa, mas boas intenções pavimenta o caminho para o inferno. continuar lendo

Alguém pensou que a mãe também e responsável pelo suprimento das necessidades de seus filhos? Afinal estamos no século XXI. E porque sempre assumir que o pai e o único responsável e incapaz de sustentar os filhos sem que a genitora tenha qualquer participação? Ai vem medidas coercitivas, prisão, penhora, etc. Como so o pai fosse o único responsável pelos alimentos! E hora de mudar essa mentalidade, deixar de ser feminista e apoiar as que usam os filhos para sua sobrevivência. Sem falar em alienação parental e agora outros subterfúgios legais providos pela Lei Maria da Penha, etc. Nao esta fácil para os pais que não tem proteção alguma e nem direitos. Essa e a realidade na maioria dos casos. Culpa nossa que não assumimos o papel de coitados e tampouco fazemos escândalos! continuar lendo

Dra Amanda
Sou avó e sustento minha filha de 42 anos e meu neto de 8 anos, ambos com problemas d e saúde. O pai do meu neto mora nos EUA, em Minnesota e não colabora em nada tampouco a mãe dele que gasta todo o seu dinheiro nos cassinos de lá .Na ocasião do nascimento, já estavam separados porque ela não conseguiu visto para embarcar. Como tenho q agir para cobrar pensão do pai sem registro de casamento e de nascimento onde não consta o nome do pai?
Por minha vez como fazer para que recebam pelo menos parte da minha aposentadoria qd eu morrer? continuar lendo